2005/06/04

LUTO

Anda por aí a circular um e-mail (eu já recebi uns 10!) a apelar aos portugueses para que no próximo dia 10 de Junho (Dia de Portugal) hasteem uma bandeira preta nas suas casas, há semelhança do que sucedeu o ano passado aquando do Euro2004, que grandes partes dos lares colocaram a bandeira nacional orgulhosamente a esvoaçar ao vento.
Pretende esta iniciativa que o povo mostre a sua revolta e desilusão perante o aumento de impostos e o actual estado financeiro do país...
Paralelamente recebi um outro e-mail, com um humor muito bem conseguido, em que se mostrava um anúncio típico de uma venda de casa. Mas a venda era de um país, o nosso.
Ontem sorri quando abri um outro e-mail e li uma proposta que era feita ao Primeiro-Ministro, em que o autor sugeria que o seu ordenado ficasse todo nos cofres do Estado e que este pagasse todas as suas despesas mensais.
O humor português, mesmo em tempos de crise sempre foi e será sempre corrosivo! Já o Rafael Bordalo Pinheiro é exemplo disso.
Ainda não sei o que pensar de tudo isto, muito sinceramente. No que é pedido no 1º e-mail não o irei fazer, até porque nunca hasteei a bandeira nacional na minha casa, embora tenha uma bandeira que me foi oferecida há mais de 15 anos e que prezo enquanto símbolo e que respeito muito, porque traduz os séculos de História que temos, a sumula dos nossos genes. O meu patrotismo (ou chamemos-lhe consciência colectiva) é interior e não preciso de erguer a bandeira para o exercer diariamente.
Quanto ao desagrado... pois claro que me sinto preocupada com o caos económico, embora tenha consciência de que existe muito marketing político pelo meio... Mas o desagrado deveria ser demonstrado por actos contínuos, não por colocar uma badeira preta à porta de casa e depois ir sentar-me no sofá...
Somos um povo que vive à sombra da "lei do desenrasca", onde só não foge aos impostos quem não pode. Talvez pudessemos mostrar o nosso descontentamento para com o sistema exigindo, em todas as compras, a factura que nos pertence de direito, abrindo caminho a um policiamento entre todos os cidadãos. Seria justo que o sistema funcionasse de facto e isso não depende exclusivamente dos governos, mas dos cidadãos.
Uma estória que me ficou guardada na memória foi esta:
Quando pedimos o crédito para a aquisição da nossa casa (em 2002), no banco exigiram uma série de documentos, como habitual. Um dos documentos é a declaração de IRS. Quando a minha gestora de conta me pediu o IRS de 2000, com a devida nota de liquidação, eu perguntei-lhe porque é que não se entregava a declaração já de 2001, dado que já a tinha entregue. A resposta deixou-me abismada: "ah! pois, porque ainda não sairam as notas de liquidação e nós tivémos muitos problemas há uns anos por causa disso, é que as pessoas geralmente fazem 3 ou 4 declarações de IRS por ano!", eu perguntei logo porquê (às vezes consigo ser inocente), responde-me ela: "porque fazem a 1ª que entregam no infantário e onde apresentam baixos rendimentos para pagarem menos, depois anulam essa 1ª e entregam uma 2ª com rendimentos altos para poderem pedir crédito na banca e, finalmente, fazem a 3ª que é a real, isto se não precisarem de mais nenhuma declaração entretanto!".
Acho que isto representa bem aquilo que por aí existe... por isso deixei de me espantar quando comecei a perceber que alguns colegas de faculdade que recebiam bolsas de estudo eram os que chegavam de carro e não eram carritos...
O slogan nacional é "salve-se quem puder" e o meu luto não é para com 800 anos de História, mas sim para com o comum dos portugueses...

6 Comentários:

Blogger Mente Assumida disse...

Também recebi esse e-mail e embora me tenha sido enviado por uma pessoa que muito estimo, jamais hastearia uma bandeira negra no dia de Portugal. Nada tem a ver com sentimento patriótico, que até nem tenho muito, diga-se em abono da verdade, já que sou portuguesa por acaso, pois poderia ter nascido em qualquer outro país (a minha ascendência até é parcialmente espanhola, calha bem!...).

Não o faço porque não estou desiludida com o país em si, mas sim com alguma população que não compreende o que é, na realidade, partilhar um país, partilhar uma Estado, partilhar interesses comuns. Estou desiludida com alguns políticos que são os primeiros a ter a mentalidade pequenina do "eu primeiro e os outros que se lixem". Estou desiludida com a falta de empenho da generalidade das pessoas em resolver a grave situação com que todos nos deparamos. Estou desiludida com a falta de consciência colectiva...

Porém, não posso esquecer todas as pessoas que sei que lutaram e lutam para fazer deste país um espaço de direitos e deveres, onde seja agradável viver e exista, de facto, solidariedade. Foi este espírito que fez Portugal nascer e há-de ser este espírito que eu tentarei manter vivo.

5/6/05 13:56  
Blogger ...dina disse...

Mente: Entendo perfeitamente o que queres dizer e não poderia concordar mais com a tua opinião. Ainda temos um longo caminho a percorrer no que concerne à percepção real do termo "cidadania"...

6/6/05 11:15  
Anonymous Anónimo disse...

não temos que ficar desiludidos. "cavamos" a nossa sepultura em ter niveis absurdos de abstenção, em que nem sequer se traduz num "puxão de orelhas" ao governo. Traduz-se sim num fantástico "estou-me a cagar".
E eles cagam, porque as pessoas não estão interessadas.
E foi preciso um anormal como o Santana Lopes, para as pessoas pegarem em si e irem às urnas votar para o tirar de lá.

Talvez o devessem ter feito à 16 anos atrás, mostrando que estavam atentas, prontas a castigar.

por isso ainda nao entendo por que razão toda a gente fica indignada e surpresa porque o governo não cumpre as promessas mais idiotas de sempre.
E agora exige-se competência e rigor...vai demorar o seu tempo, é dar um voto um voto de confiança. é não confiar numa oposição obsoleta de putos de puto sadolescentes, que só contrariam para chatear.

tou lixada com F. a vontade de sair daqui é cada vez maior.
Como propunha num blog de leitura habitual, manifestação era num belo dia passar a fronteira. e marcar posição. desertar.

Q

ena! tantas letras!!!

6/6/05 11:29  
Blogger ...dina disse...

Q: esmeraste-te! ;)

O teu comentário fez-me lembrar o "Ensaio sobre a Lucidez", do Saramago... no fundo assenta nessa possibilidade que todos nós, cidadãos, temos para mostrar o descontentamento e/ou que somos parte integrante das decisões, não apenas o que pagam as mesmas.

6/6/05 11:48  
Anonymous Anónimo disse...

na verdade, nós não vivemos numa democracia, mas sim numa républica. Nós votamos para que decidam por nós...

Q

6/6/05 12:55  
Blogger ...dina disse...

Q: somos uma república democrática. A democracia dá a todos a possibilidade de elegerem mas, também, de serem eleitos.

Mas é um sistema falivél, embora, de todos, seja o menos mau...

6/6/05 13:23  

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